quarta-feira, 5 de novembro de 2008

O apelido íntimo


A cena é corriqueira: numa mesa de bar algumas pessoas engatam acalorada discussão sobre um daqueles temas que nunca deveriam ter sido introduzidos na conversa. Em meio ao fogo cruzado de opiniões ninguém se ouve nem se entende até que, de repente, uma frase proferida por um dos presentes consegue calar por instantes todos os demais.
Não, não se trata da repugnante manifestação de determinado ponto de vista, tampouco de um argumento capaz de elucidar a questão. O que deixou os até então engajados palpiteiros sem palavras foi o constrangimento causado por uma inesperada demonstração de afeto entre um dos casais, algo como “me passa o guardanapo, tchugui-tchugui?”.
“Nenê”, “Tetéia”, “Fofonildo”, “Favinho de Mel”, “Piquirucho”, “Amoreco”, ou mesmo uma dessas expressões que de tão particulares se tornam incompreensíveis, são a comprovação de que não há forma mais eficiente de se aniquilar uma boa reputação do que tornar público um apelidinho íntimo, ainda mais quando isso se dá involuntariamente.
Uma vez revelados perante amigos ou familiares os apelidos dificilmente são esquecidos e, quanto mais se foge deles, maior é a chance de se sobreporem ao seu verdadeiro nome de batismo. Na casa dos meus pais trabalhava uma moça cujo marido tinha um desses apelidos. O curioso é que nunca soubemos como o rapaz se chamava realmente, até porque quando ligava para falar com a esposa se apresentava como “Benzinho”.
Os apelidos íntimos são bastante populares porque cumprem importante função num relacionamento. Além de atestar cumplicidade e comprometimento - ­o que pode ser bastante conveniente no início de um namoro - essa forma diferenciada de tratamento é um excelente ponto de partida para aqueles momentos onde as circunstâncias impõem a necessidade de se contemporizar:
“Favinho de Mel, sabe aquela pilastra que tem na garagem aqui do prédio…” ou “Se eu sei quando é nosso aniversário de casamento? Ah, Fofonilda, que pergunta…” são exemplos de como um apelido íntimo bem aplicado pode vir bem a calhar.
Certa vez uma namorada minha decidiu impor um apelidinho desses, à revelia. Acho que foi logo depois daquela fase de escolher a música tema do casal, talvez para ela uma evolução natural de nosso crescente envolvimento, penso eu. Como poderia aceitar um apelido íntimo escolhido assim, racionalmente? Também não se referia a nada que tínhamos vivido, nem mesmo fazia menção a uma piada interna do casal. Entendam que um sujeito não pode aceitar passar a ser chamado de “Chuchu” sem uma razão no mínimo convincente.
No mais, como poderia nutrir qualquer tipo de identificação por um legume sem graça, feio e que ainda por cima nem é uma hortaliça rica em vitaminas? Não adiantava argumentar, o “Chuchu” acabou pegando, mesmo a contra-gosto, aliás como é comum a maioria dos apelidos. Felizmente o meu “Chuchu” não virou “pepino” nem “abacaxi” porque se manteve a salvo dos conhecidos. Antes de rirem do meu passado, sugiro que refresquem suas memórias afetivas. E que atire a primeira pedra quem nunca passou por algo parecido!
Postado por Bruno Medina em 02 de Maio de 2008

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